sexta-feira, 29 de junho de 2007

Cotas e racismo. Mais sobre cotas nas universidades...

Recebi hoje o comentário de um colega, o Hermes Medeiros, pesquisador do Museu Emílio Goeldi no Pará. Resolvi transcrever o comentário aqui porque acho que ele tem uma idéia muito clara do que é racismo e de como as cotas o refletem. Tomara que sirva pra refletir um pouco mais sobre o tema.

"Oi karlinha,

Vou dar uns pitacos também. Acho que a cota associada a “raça” pode ser resumida como “atribuir um favorecimento a alguém com base em sua “raça”” o que inevitavelmente implica em “desfavorecer alguém com base em sua “raça””. Isto é racismo. Aqui não estou colocando minha opinião. É o que a palavra racismo significa!
Não existe racismo positivo. Em qualquer sociedade racista sempre poderíamos achar pessoas inteligentes que argumentariam bem em favor de seu ponto de vista. Seria possível, por exemplo, argumentar a favor da necessidade econômica da escravidão, por exemplo. O problema não é o racismo negativo, mas o racismo. Estávamos experimentando uma diminuição do racismo, como podemos observar comparando as opiniões de pessoas de diferentes idades.
Esta iniciativa de “racismo positivo” é um grande retrocesso, nos obrigando a discutir inclusive métodos para determinar a raça de cada um de nós; quando a tendência natural seria colocarmos a cor como mais um de tantos aspectos que variam entre nós, como estatura e peso. O que está mais de acordo com os resultados obtidos pelos estudos de genética.
Um argumento a favor das cotas é de que a falta de oportunidade passa de uma geração para outra. Consequentemente as crianças não nascem com oportunidades iguais. Também não aceito que as cotas por “raça” sejam a forma certa de tratar isto. Neste país nascem crianças sem oportunidade de estudar de todas as cores, porque descendem de escravos, porque descendem de retirantes da seca, porque são filhos de alcoólatras, entre outros. As cotas atendem uma destas categorias em detrimento das outras. Para aquele, que por sua cor não entra na cota, mas, como a maioria dos brasileiros, não teve acesso a uma boa escola, a universidade fica ainda mais difícil.
O que fazer então com relação à associação entre cor e renda? Simples. Esquecer a cor. A história deixa associações entre variáveis genéticas e econômicas/culturais no mundo todo. O problema não é o negro sem oportunidade, mas o homem sem oportunidade.
E o que fazer contra o racismo? Marcação cerrada diretamente em cima dele. E não vamos deixar este trabalho só para o estado. Você tem um amigo racista? Você tolera comentários racistas? Eu só tolero, ainda que detestando, o racismo em pessoas com mais de 50 anos, pois eles foram formados em sociedade diferente da minha e que um dia vai ser substituída. Quando encontro uma pessoa jovem racista (ou com qualquer outro preconceito ridículo), vejo isto como um indicador de mal-caratismo e tendo a excluir no meu convívio, além de criticar na hora sempre que possível, claro. É meu critério".

10 comentários:

Anônimo disse...

Karlinha, adorei a idéia do blog...
Concordo em partes com o comentário do Hermes (aliás, um beijão pro Hermes...saudades). Também acho que as ações de inclusão deveriam visar o favorecimento dos mais pobres.
No entanto, tenho um pouco de angústia com relação a esses comentários de que as cotas seriam um racismo às avessas. É engraçado como existe uma medo tão grande de não se poder identificar os negros justamente na hora em que é pra incluí-los. Ora, a sociedade brasileira sabe muito bem identificar o negro na hora de excluí-lo. Basta ver as estatísticas sobre o número de negros nas universidades, em cargos de chefia, etc. Isso levando em consideração que grande parte da população brasileira tem ascendência africana.
Por que ninguém critica as cotas para os portadores de deficiência, por exemplo? Acho que isso é reflexo do incômodo que, na prática, se sente quando um negro está numa posição de destaque na sociedade - desde que não seja ligada às artes, sobretudo à música...aí é permitido.
Meu marido é negro, assim como alguns de meus melhores amigos. Convivo, muitas vezes, com um grande estranhamento por parte da maioria das pessoas. Ainda é chocante, diferente, fora do comum, o fato de uma mulher branca, loura, de família classe média, estar casada com um homem negro. Só lamento, pois isso reflete a raridade da situação.
Pensemos então: quantos amigos negros vc tem? Quantos negros havia na escola onde vc estudou? Quantos colegas de trabalho negros vc tem? Quantos faxineiros, pedreiros, operários, mendigos negros vc já viu?
Todos sabemos o que isso reflete. Não vamos nos conformar com isso como se fosse natural.
Minha opinião oscila, de tempos em tempos, entre a favor e contra as cotas. Mas acho que a discussão vale a pena. Não vamos fazer como a maioria do povo brasileiro, que acha que o racismo existe, mas não se considera racista. Pergunte a si mesmo "onde será que eu escondo o meu preconceito?"

Tibério disse...

Oi Karla,
Eu concordo com o Hermes! Acho que não há racismo positivo que auxilie ou justifique um sistema de cotas para qualquer finalidade. Creio que graves problemas poderão advir com a implantação de cotas em vestibulares. O principal seria o fato de incitar a discriminação dentro das próprias universidades como, por exemplo, alunos brancos que não veêm com bons olhos os colegas negros. Mas o que eu não vejo as pessoas falando é da natureza paliativa dessa proposta. Ninguém grita por aí que a solução real para este problema não é a implantação de cotas nas universidades, mas sim a aplicação correta de recursos públicos no ensino fundamental. Ações paliativas com efeito a curto prazo nunca foram a solução de problema algum. O problema é que não há uma vontade política real de se mudar a situação. Caso houvesse, já teriam canalizado todas as forças gastas na defesa de cotas para aprovação de projetos como o do ministro Fernando Haddad para criação de um piso salarial para professores no Brasil. Não quero defender o Haddad, mesmo porque discordo de algumas de suas opiniões (como progressão continuada) mas não vejo vontade de se fazer investimentos sólidos que resolveríam a médio e longo prazo o problema de exclusão social de pbres e negros. Um exemplo que todos citam é o caso da Coréia do Sul que em 20 anos saiu de país essencialmente agrário para pólo tecnológico a partir do momento que seus políticos decidiram fazer um pacto verdadeiro de política pública para favorecimento da educação. Entrava governo ou saía governo, educação era a área a se investir. Deu no que deu: hoje as duas Coréias possuem um abismo educacional. Agora eu pergunto: mesmo que em 20 anos consigamos "pagar" o deficit com os negros, uma vez instaurado o sistema de cotas em todas as esferas do governo: quem vai conseguir retirar o sistema de cotas? Aí sim estará institucionalizado a discriminação nesse país!!

Anônimo disse...

Oi pessoal!
Mais uma vez, vou fazer o papel de advogada do diabo...
Tibério, vc tem muita razão no que diz. No entanto, não vejo como uma coisa tão difícil criar mecanismos para instituir as cotas com mais cautela. O problema é que tudo no Brasil é feito "nas coxas". O sistema de cotas, se implantado, tem que prever alguns possíveis percalços. Ele poderia ser implantado por um período, ou até que a porcentagem de negros nas Universidades fosse X%, por exemplo.
Já há algumas Universidades utilizando sistemas de cotas e acho que os resultados poderiam ser melhor divulgados. Tenho uma amiga que é professora da UENF, que já tem sistema de cotas há uns 4 anos, e ela relata que a experiência desta Universidade tem sido muito positiva, na opinião dela.
Concordo que existe o risco dos alunos 'cotistas' sofrerem alguma discriminação, mas não acredito que isso vá representar algum sério entrave. A realidade é que os negros já são discriminados. Portanto, é menos mal que eles sofram a discriminação na Universidade, preparando seu futuro profissional, do que fora dela. Além disso, cabe às Universidades coibir este tipo de coisa, se ocorrer.
Afora isso tudo, as cotas só vão garantir que mais negros freqüentem as Universidades, e não que eles sejam aprovados nas disciplinas. Portanto, qualquer aluno, cotista ou não, estará sujeito a um mesmo nível de avaliação para conseguir seu diploma.
Também gostaria muito que o sistema de educação básica fosse bom o suficiente para propiciar a todos a possibilidade de ascensão social. Mas há gerações que já foram completamente excluídas por esse sistema podre que hoje temos. O que fazer com elas? Por que não dar uma oportunidade também a essas pessoas? Atualmente, praticamente não há mobilidade social no Brasil.
Uma boa saída, meio pela tangente, é a solução que a Unicamp deu pra isso. Ao invés de cotas, os alunos que cursaram pelo menos o Ensino Médio em escolas públicas ganham pontos a mais no vestibular. O importante é não ficarmos paralisados enquanto a coisa se deteriora cada vez mais.
Sei lá. São só coisas que penso...como disse, nem sei se sou a favor ou não das cotas. Mas acho que temos que questionar sempre e tentar ver as coisas por vários ângulos. Espero, com isso, contribuir para a discussão. Espero também que mais pessoas se manifestem sobre o assunto.
É isso (por enquanto).

Anônimo disse...

Oi, Karla!!!

De fato, achei muito interessante essa altercação sobre racismo. Sou inteiramente contra a criação de cotas nas universidades federais... Na minha modesta e talvez leviana opinião, as cotas são na verdade uma espécie de atestado de inferioridade, de incapacidade, ou seja, elas defendem algo que não procede na verdade.
Cor, "raça", enfim, o fenótipo não determina efetivamente o potencial intelectual de ninguém (pelo menos penso que não). O problema, na verdade, reside num ponto anterior: é a educação básica que não oferece os subsídios necessários para se ingressar em uma instituição de ensino superior. Portanto, se alguma medida deve ser tomada, e com certeza deve, ela tem que ser dirigida aos ensinos fundamental e médio de nosso país.
A política de cotas nada mais é do que uma medida paliativa; é tentar, como dizem, "tapar o sol com a peneira". Portanto é algo impraticável, visto que, além disso, se limita ao problema da exclusão racial, apenas um parcela de todo o problema.

Bem, esse é o meu parecer sobre o problema.

Obrigado pela atenção, e até mais professora!!!

Anônimo disse...

Karla, como sabes sou meio radical (hehehe) !!!! por isso sou totalmente a favor dos menos favorecidos…e o que os negros são neste país? Sim, também concordo que as cotas deveriam ser para pobres, mas qual é o percentual de negros bem de vida no Brasil? Nem precisa ser rico, mas com alguma condição digna de vida que possa dar ao seu filho uma boa educação (que no Brasil, só particular)? Quantos negros vocês conhecem que estão bem de vida? Eu, não conheço nenhum!!! E é sério, sem exageros, e se vocês conhecem, quantos são? Um, no máximo dois, sei lá!!! Já foi muito bem dito que a solução não é bem esta, mas como resolver o problema atual? Vamos mandar os negros e pobres em idade universitária (e que querem entrar na Universidade) de volta ao ensino fundamental, se ele for reformado?! Precisamos com urgência solucionar o problema do ensino fundamental e médio, mas e quanto ao seu amigo negro que nunca estudou em uma boa escola? O problema de agora de muitas pessoas precisa ser resolvido, e os negros carregam uma carga histórica negativa neste sentido, qualquer pessoa sabe disso. A respeito de as cotas terem de ser para pobres, olhem este trecho que tirei de um site e era bem o que eu queria dizer: “Mesmo entre os pobres, o número de negros pobres está 47% acima dos brancos, ou seja, existem mais pessoas miseráveis negras do que brancas, e entre estas, os negros são os de menor salário e poder aquisitivo; a remuneração para um mesmo cargo é diferente entre negros e brancos. A maioria (na realidade, uma minoria) dos alunos oriundos de escolas públicas que conseguem entrar em uma universidade pública no Brasil são brancos, ou seja, mesmo entre aqueles que conseguem vencer a diferença, os negros são minoria (http://www.klepsidra.net/klepsidra16/cotas.htm)”. Eu, na minha ingenuidade de alguns tempos atrás, acreditava que não existisse mais racismo no meio em que eu convivo, já que as pessoas são tão bem esclarecidas e intelectuais dentro da Universidade, porém a realidade é triste.... as pessoas instruídas, que deveriam promover e educar contra o racismo, também são racistas, porque está na sua formação, porque estas pessoas, quando estudantes, não tinham um colega negro para conviver com essa diferença! Eu acho ótimo que no próximo semestre teremos cerca de 20 alunos negros, em uma turma de 100 por exemplo, entrando em uma turma de medicina ou odontologia, porque enquanto não tivermos de ser atendidos por um médico negro que salvará vidas, ou enquanto não existirem negros nos cargos ditos “importantes” o racismo não acabará nunca. Imagine uma pessoa racista tendo de ser salva por um médico negro! O racismo só vai acabar quando se tornar comum encontrarmos negros em bons cargos e tivermos de conviver com isto. Tenho escutado muito as pessoas falando: ...”imaginem como será na universidade... os alunos negros não vão acompanhar a matéria como os outros....não terão dinheiro para comprar material... isso não vai durar...” Bem, se for assim, o pobre tem mais é que ser lixeiro (com todo o respeito a esta profissão) pois não precisa ter investimento nenhum! pois não precisa de estudo! pois é uma profissão discriminada! Isso é um absurdo! Deixem as pessoas se virarem, e quem não nasceu para estudar (pobres ou ricos podem ter gosto para o estudo ou não) não vai continuar, mas pelo menos aqueles que querem estudar terão a chance. E se agora os negros ricos entrarem nestas cotas? Bem, o negro bem de vida que quisesse entrar em uma universidade, já entrou, ou entraria sem precisar de cotas assim como um branco bem de vida!
Desculpem escrever tanto, mas meu entusiasmo me permitiria escrever mais ainda... vamos refletir mais sobre como cada um de nós pode promover a luta contra o racismo e pela igualdade! Abraços...

Karla Yotoko disse...

A discussão tá ficando tão boa que nem dá vontade de escrever sobre outro assunto... Eu era radicalmente contra as cotas, por uma série de motivos, mas principalmente por acreditar que elas aumentariam o racismo no país (ou deixariam este racismo mais evidente). Pelo que li aqui, há prós e contras como em tudo na vida, mas talvez o balanço seja mais positivo que negativo, tanto para os beneficiários de cotas quanto para o país. Como eu disse no meu primeiro "post" sobre cotas, conversei com alguns alunos negros(que seriam beneficiários de cotas para negros caso elas fossem aplicadas nesta universidade), e foi a forte reação deles contra as cotas para negros que me fez escrever sobre isso.
É um assunto de fato controverso. O ideal seria a adoção de cotas e a melhora do ensino fundamental ao mesmo tempo. Neste ideal, em um prazo de 20 anos entrar na universidade através de cotas ou não já seria um detalhe, já que seria tão difícil entrar pelas cotas quanto pelas demais vagas...

Tami Cris disse...

Bom dia Karlinha...Concordo em voce em alguns trechos mas discordo em outros porque não deveria existir cotas só pela cor e sim pela classe social.Saiba q não existe só negros pobre e sim brancos,se há direitos porque não usar igualmente para todos?.Na classe pobre não existe só o negro,o mulato,o pardo e o indio e sim tambem o branco.A legislação deveria reformular todos esses direitos e alem do mas dar mais oportunidades aos jovens no mercado de trabalho.

Anônimo disse...

Quero deixar uma poesia de Edsom Gomes que resume a situação dos negros no Brasil e quero tambem diser que ir contra as cotas é mais uma forma de reprimir o movimento negro no brasil, ou talvez o medo de ter de competir com pessoas extremamente capazes mas que por falta de investimentos e de um direcionamento maior de verbas para a educação, insentivo na qualificação dos professores da rede de educação publica não tiveram uma boa base para competir com pessoas que cursaram as preliminares estudantis na rede de ensino privado grandes nomes como Machado de Assis ,Nilton Santos,padre José Maurício Nunes Garcia, e Aleijadinho e Rui Barbosa dentre outros comprova a condição e competencia de um povo que quando tem oportunidade mostra o quanto vale.


Sim, somos nós que estamos nas calçadas
Sim, somos nós que estamos nas prisões
Nos alagados
Sim, somos nós os marginais
Sim, somos nós brutalizados
Os favelados dos porões do inferno
O inferno é aqui

Sim, somos nós os sem direitos
Sim, somos nós os imperfeitos, somos os negros

Sim, somos nós filhos de jah
Sim, somos nós perseguidos
Os habitantes dos porões do inferno
O inferno é aqui

Rei do Ebano disse...

Quero deixar uma poesia de Edsom Gomes que resume a situação dos negros no Brasil e quero tambem diser que ir contra as cotas é mais uma forma de reprimir o movimento negro no brasil, ou talvez o medo de ter de competir com pessoas extremamente capazes mas que por falta de investimentos e de um direcionamento maior de verbas para a educação, insentivo na qualificação dos professores da rede de educação publica não tiveram uma boa base para competir com pessoas que cursaram as preliminares estudantis na rede de ensino privado grandes nomes como Machado de Assis ,Nilton Santos,padre José Maurício Nunes Garcia, e Aleijadinho e Rui Barbosa dentre outros comprova a condição e competencia de um povo que quando tem oportunidade mostra o quanto vale.


Sim, somos nós que estamos nas calçadas
Sim, somos nós que estamos nas prisões
Nos alagados
Sim, somos nós os marginais
Sim, somos nós brutalizados
Os favelados dos porões do inferno
O inferno é aqui

Sim, somos nós os sem direitos
Sim, somos nós os imperfeitos, somos os negros

Sim, somos nós filhos de jah
Sim, somos nós perseguidos
Os habitantes dos porões do inferno
O inferno é aqui

cybergirl disse...

Pouca vergonha essa questão de cotas! Junta cotas raciais, cotas pra estudante de escola pública… dá por volta de 50% das vagas. Agora cotas para deficientes! E o mérito, onde fica???? E a justificada indignação de quem ralou o ano inteiro para fazer uma prova e fazer jus a sua vaga na universidade e se vê de fora enquanto uma criatura, rindo da sua cara, com menos da metade da pontuação, está dentro?
Qualquer país desenvolvido estimula seus cidadãos a serem proativos, a lutar para conquistar o que possuem pelos próprios méritos.
Enquanto isso o Brasil continua sua “política dos coitadinhos”. Política eleitoreira, sem dúvida, que acaba por desestimular o trabalho, o estudo e, por conseguinte, a pesquisa e o progresso!
Até quando seremos esse país de bolsa-esmola e cotas pras cocotas?
Vergonha demais de ser brasileira! Vou embora dessa m*rda de país antes que comecem a me punir por ser inteligente, estudiosa e trabalhadora!
E o último que sair apague a luz!!!